sábado, 11 de fevereiro de 2012

Você Precisa LER: A Menina Que Roubava Livros


Sem sombra de dúvidas, um dos motivos que mais fazem o leitor ter a atenção fisgada já nas primeiras páginas deste "A Menina Que Roubava Livros" é a particularidade do narrador. Neste caso específico, da narradora: a Morte.
Sai o autor na terceira pessoa e entra a inusitada personagem cadavérica (embora ela mesma não se descreva desta forma) narrando, também, (na maior parte do tempo) em terceira pessoa. Mas, ao mesmo tempo, como uma participante dos fatos ocorridos no decorrer da leitura.

O segundo motivo que prende o leitor é a forma como a obra é organizada. Capítulos relativamente curtos, linguagem leve, trechos que destacam pensamentos importantes e, por vezes, até adiantam alguns acontecimentos. Nem por isso somos tomados pela decepção de um spoiler; pelo contrário: nos aguçam ainda mais a curiosidade. Afinal, a narradora já adianta desde o início: "EIS UM PEQUENO FATO: Você vai morrer". Se o leitor morre, certamente os personagens da história também morrem.

Mas, aqui, o que interessa é saber como eles morrem.

Enfim, o terceiro - e, diga-se de passagem, o mais importante e relevante - motivo que nos fisga é a própria história sobre "uma menina, algumas palavras, um acordeonista, uns alemães fanáticos, um lutador judeu e uma porção de roubos".
Liesel Meminger é uma garota que é confiada, já crescida, a pais adotivos em plena alemanha nazista. A menina sofre com a morte do irmão mais novo que deveria lhe fazer companhia na casa dos novos pais. Além, é claro, da angústia de ter sido separada da mãe.
Para aliviar a dor, ela conta com o carinho de Hans Huberman, seu pai adotivo, com a amizade do garoto Rudy Steiner e com um passatempo peculiar: roubar livros.
Inicialmente analfabeta, na medida que a menina vai descobrindo as palavras, também passa a conhecer mais sobre o mundo ao qual está inserida e, cada vez mais, passa a entender a importância e o perigo que a palavra têm na história da humanidade, especialmente depois que seu pai resolve esconder um judeu no porão de casa.

Diferente de tantas histórias que se passam neste período histórico, "A Menina Que Roubava Livros" não apela para emoções baratas facilmente conquistadas com o conhecimento prévio a respeito da maneira atroz que os "não-alemães" eram tratados na Alemanha de Hitler. Apesar disso, a decisão do autor australiano Markus Zusak em ambientar seu romance na época da Segunda Guerra é decisiva para que os acontecimentos tenham o peso que têm; e a menina não compreenderia o quanto a palavra - que ela tanto amava - poderia ser consoladora ou destruidora.

Não me recai nenhum tipo de remorso, diria, ao afirmar que, na verdade, o personagem principal desta história é a palavra. Por mais "não palpável" e único que possa ser a Morte contar a história, ou tomar como coisa boa uma menina roubando, a maior peculiaridade de "A Menina Que Roubava Livros" é exatamente o poder de nos levar a refletir sobre o peso que têm a palavra, seja falada ou escrita.

Aliás, é imprescindível destacar que, para conferir realismo à trama, e na impossibilidade - óbvia - de escrever o livro na língua dos personagens, o autor insere expressões genuinamente germânicas para que lembremos que os personagens são alemães e as histórias se passam na Alemanha; logo, todos falam alemão.

E, aqui, cabe uma reflexão ainda mais profunda do quanto as pessoas vulgarizam a palavra e não valorizam o idioma natal.

Mas é claro que aos assassinos da língua portuguesa e aos que acham que a palavra é menos importante que tudo, nenhuma dessas reflexões fará sentido. Aliás, a estes, nem existe a vontade de descobrir o prazer em abir um livro.

É esta a principal lição que "A Menina Que Roubava Livros" nos passa: o quanto o interesse pelas palavras diz do caráter das pessoas; não importa se leem mal ou bem, ou  nem leem. Aqueles que sabem o que falam, têm sede de leitura e senso de justiça são capazes de dominar o mundo; diante delas, muitas coisas, por convenção, ditas avassaladoras, são mais fracas: "Jamais dispararei uma arma", pensou certo personagem. "Não precisarei fazê-lo". Ideias e palavras são mais poderosas. Para o bem e para o mal.

Lembrem-se que, para os cristãos, Deus criou o universo com a palavra. "No princípio era o Verbo (...). Tudo foi feito por ele, e sem ele nada foi feito" (João, 1).

2 comentários:

Luiza Boaventura disse...

Esse livro já é o próximo da linha de esperar pra ler... Antes preciso terminar Razão e Sensibilidade :)

Juliano Reinert disse...

Sem sombra de dúvidas, uma ótima leitura, Luiza!
Obrigado pela visita!