sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Professores e jornalistas: os novos vilões do Brasil

 

Vivemos em uma época em que eu me sinto atingido pessoalmente por conta do pensamento coletivo a respeito de alguns assuntos essenciais de uma sociedade. O governo que temos reforça esses pensamentos (ou talvez seja apenas um reflexo desse pensamento geral).


Refiro-me ao posicionamento atual a respeito da atividade de professor (que almejo) e a profissão do jornalista (que exerço).

Comecemos com os professores. Muito se fala sobre a valorização desses profissionais. Mas o que as pessoas andam querendo é, na verdade, crucificá-los. Ao professor são atribuídas as funções de corretor de conduta (como se isso não fosse algo a ser aprendido em casa), vilão do desempenho das crianças/adolescentes (como se isso também não fosse algo extra-escola) e, como se não bastasse, agora o professor é também o culpado dos males do país.

O professor é doutrinador, perversor, alienado e alienante. Diante dele, os alunos são tidos ao mesmo tempo como idiotas ou balas de canhão de uma hipotética guerrilha ideológica. Como nunca, os professores estão sendo achincalhados, privados de exercer sua autoridade de cátedra, estão sendo cerceados e condenados. E aquela maldita ideia do "Escola Sem Partido" é a maior representação disso tudo.

Como se não bastasse, o salário e as condições de trabalho continuam sendo insuficientes e, em alguns casos, degradantes.

Em seguida vêm os jornalistas. Se não bastasse o momento crítico da profissão -- em que redações estão sendo fechadas, figuras experientes e diplomadas precisam concorrer com blogueiros cheios de achismos e influenciadores digitais que não influenciam ninguém --, o trabalho jornalístico vem sendo cada dia mais desacreditado e anulado.

Ninguém está dizendo que os jornalistas são imunes a erros. Entretanto, é perigoso dizer que os jornalistas participam de uma conspiração global contra pensamentos e ideologias contrárias às deles.

Jornalistas têm sua ética profissional, a paixão pelo que fazem e o compromisso social de investigar e noticiar. Sobretudo, trabalham para jogar luz sobre eventos obscuros, denunciar erros e cobrar soluções. Elogios acríticos se limitam às assessorias de imprensa, cujo trabalho é essencial, mas precisam inevitavelmente passar pelo filtro das redações, independentes ou não.

Quer dizer, é triste que eu esteja envolvido com, talvez, duas das profissões mais desacreditadas do Brasil atual. E mais triste ainda é saber que tem muita gente que vê essas duas profissões no papel de vilãs da sociedade.
Fiquem alertas: desacreditar professores e jornalistas não é atitude de quem quer justiça social e democracia.

O inimigo não está nas salas de aula, nem mesmo nas redações. Eles estão nas grandes corporações, nas redes de milícias, no Congresso Nacional e, sobretudo, no Palácio do Planalto.

Nós jornalistas e também os professores (que um dia espero ser) apenas queremos um Brasil mais desenvolvido e uma educação transformada e transformadora. E nosso poder de fogo é quase zero contra essa cruzada de invalidação dessas duas profissões tão essenciais à sociedade.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Coisas que esquecemos que deveriam ser unanimidade universal

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
 Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil


Existem coisas que deveriam ser unanimidade entre todos os seres humanos, não é verdade? Por exemplo: não é admissível que existam pessoas que passam fome e sede. Da mesma forma, não é justificável o fato de que há gente que não tenha onde morar com dignidade, nem tenha acesso a serviços de saúde. O preconceito, seja qual for, jamais deveria ser incentivado, sob nenhuma hipótese. 


Por isso, eu não entendo as pessoas que fuçam argumentos para normalizar coisas que não são normais sob nenhuma ótica. “Ah, mas é rico é porque trabalhou por isso”. Ou “ah, mora na rua porque quer”. Ou “ah, não se esforçou o bastante”. Ou, “ah, não tem que dar o peixe, tem que ensinar a pescar”. Pior: “ah, mas como o mercado financeiro vai reagir a qualquer iniciativa que ajude essas pessoas?”. 


O mais aterrorizante é que, não raro, isso acontece defendido por justificativas religiosas. O que me traz ao infame Bolsonaro, essa besta quadrada que muitos insistem em chamar de presidente, mas que, na verdade, é apenas uma acidente da natureza, que permitiu vir ao mundo essa criatura abjeta que, por infortúnio do destino, acabou num cargo de poder.


O problema é que Bolsonaro está onde está porque ele é o sintoma de uma doença social. Quando um ser vivo fica doente e começa a ter bolhas purulentas e fétidas pelo corpo todo, a razão do mal-estar não são as bolhas purulentas: elas apenas são provocadas por uma enfermidade agressiva. São consequência, não causa.


No caso, Bolsonaro é a bolha purulenta e fétida causada pela doença social chamada normalização do anormal. O que seria essa normalização do anormal? Eu listo:


  • Ver antagonistas políticos como inimigos. É verdade que nós temos, como sociedade, divergências profundas sobre como resolver os problemas do mundo. Mas, no fim, o que deveríamos querer é que todos tenham acesso às condições mínimas para sobreviver com dignidade. Para Bolsonaro (e seus seguidores), não é assim. Só quem tem direito a condições humanas de vida são os que pensam como eles. O restante, que morra e vá pro inferno.

  • Ver a pobreza como preguiça. Quem pensa como Bolsonaro acha que pobreza é uma consequência da falta de vontade. É fácil você falar que é possível conquistar o que quiser só com o trabalho se você vive em condições para isso. Mas tem gente que não tem nem água potável em casa! Os problemas sociais são complexos demais para ter uma visão tão reducionista e simplista das coisas.

  • Ver o mundo como uma eterna luta de bem contra o mal. Tenham dó, minha gente! Isso deve ser muita Disney na vida das pessoas. Ninguém é completamente bom ou completamente mal. Mas, para Bolsonaro e seus seguidores, há um mal a ser derrotado e eles, os bolsonaristas, são o bem, os emissários de Deus.

  • Ver a religião como prova de moral. Religião não é sinônimo de retidão em nenhum lugar do mundo, nem na história. Aliás, religião não, né? Cristianismo. Para Bolsonaro, só presta quem é cristão. As outras crenças são apenas toleradas e devem se curvar à maioria. Os seguidores dessa anta pensam exatamente assim. Porém, se religião fosse sinônimo de moral, não haveria tantos casos de pedofilia na Igreja Católica e de lavagem de dinheiro em igrejas neopentecostais. Pior é que gente como Bolsonaro acha que as “ovelhas negras” dentro do cristianismo são exceção, não regra. Tolinhos!

  • Ver o mundo como um grande palco de teorias conspiratórias. Todo mundo já ouviu a expressão “história de pescador”, não é mesmo? Antigamente, isso era motivo de riso, mas hoje as pessoas estão acreditando nas histórias de pescador! E fazem mais esforço para acreditar em teorias da conspiração do que na realidade. A cegueira é tão absurda que eles se recusam a ouvir argumentos comprováveis para sustentar suas crendices ridículas, como a Nova Ordem Mundial, Terra Plana e outras sandices.


Há muito mais a ser dito, mas falar do Bolsonaro me dá gastrite, então vou parar. Ele é o pior mal que a humanidade já provou em décadas, sem dúvida. Um ser asqueroso e desprezível, desumano e mentiroso, egoísta e egocêntrico. Mas, como disse, o pior é saber que ele não é a doença, mas um sintoma dela. Se Bolsonaro deixar de existir, ou se recolher em sua insignificância, a ruindade e a desumanidade que ele representa continuarão existindo.


Claro, Bolsonaro não é o único ser desprezível no mundo. Tem muito empresário que tira comida dos pobres para engordar seu bolso, têm muitos outros políticos que deixam faltar oxigênio em hospitais para garantir sua decoração na casa de praia, enfim… Mas Bolsonaro concentra o que há de ruim em todas as pessoas e em todas as práticas nocivas à sociedade em si mesmo. Incrível a façanha desse sujeito!


Comecei este texto falando do que é inaceitável na sociedade e terminei falando do Bolsonaro. Enfim, pra dar alguma coerência ao que tô falando aqui, quero, então, elencar de novo o que eu acho que jamais deveria ser aceito, mas acaba sendo naturalizado pelas pessoas atualmente: gente passando fome e sede, gente sem ter onde morar dignamente, cidadãos sem acesso à saúde, o preconceito e Bolsonaro.


Deveria ser uma opinião unânime na sociedade. Ninguém deveria aceitar nada disso. Infelizmente, não é assim que acontece. É por isso que estamos caindo buraco abaixo. 


Enquanto não recuperarmos nossa humanidade, nossa capacidade de olhar o outro com compreensão e respeito, jamais seremos dignos deste mundo. É triste pensar assim, mas mais triste é saber que há quem não se importe com nada disso, que faça da sua vida uma grande bajulação ao próprio umbigo.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Ano novo, blog novo

 

Início do ano todo mundo se enche de projetos e planos. E mais uma vez um de meus projetos é voltar a atualizar este espaço com alguma frequência. Não porque eu esteja ávido por leitores, porque queira ganhar dinheiro com o blog ou porque tenha algum plano para ele. Eu simplesmente acho importante para mim.

Mas eu decidi que este será, primordialmente, um espaço de desabafo, de reflexões pessoais. Em outros momentos, o Andarilho serviu como uma forma de eu argumentar, trazer informação sobre política, sociedade, filmes, livros e assuntos da cultura pop. Porém, há dois problemas (entre tantos outros, claro) de se continuar a produzir esse tipo de conteúdo.

Vocês não estão cansados de conteúdo?


Nós estamos tão mergulhados em informações em todos os lugares e sem tempo para aproveitarmos ou absorvermos elas. Uma vez, meu professor de Fotografia na faculdade de jornalismo nos incentivou a ter um blog. A justificativa dele era que, enquanto jornalistas, era importante a gente expor a nossa opinião sobre as coisas e que isso poderia servir como um diferencial no mercado.

Hoje, acredito, o conselho dele seria outro. As pessoas andam tão cheias de opinião que não são capazes de ouvir o contraditório. Não há mais debate, apenas lacração e militância contra tudo e contra todos.

As pessoas estão erradas em militar? Bom, na minha visão, depende. Há militâncias legítimas, mas há aquelas ridículas, como quem prega um dia do orgulho hétero ou aqueles que dizem que não deveria existir o Dia da Consciência Negra, mas o Dia da Consciência Humana.

O que quero dizer com isso? É que eu não pretendo que este blog seja um lugar para ensinar ou informar nada a ninguém. Como qualquer rede social, que a maioria das pessoas simplesmente acessa para curtir conteúdos inúteis e saber da vida do outro (seria mais leve se fosse assim, embora não seja mais, infelizmente ― e é estranho dizer “infelizmente” sobre ficar de fuxico sobre a vida do outro, né? Pra ver o nível em que chegamos, mas divago), este será uma espécie de diário virtual. Como os blogs das antigas, sabe?

Sinto falta de uma internet mais leve, divertida e despretensiosa. Aliás, não só de a internet ser assim, mas de a vida ser assim. Nós temos levado tudo a sério demais e até o discurso de não levar as coisas muito a sério tem virado conteúdo vendável, vocês percebem? Textos do tipo: “6 motivos para não levar as coisas a sério demais”; ou “5 formas de levar as coisas menos a sério”. Me canso.

Parece contraditório e hipócrita o que estou dizendo? No sentido de não querer mais tanto conteúdo e ainda assim estar alimentando um blog? Pode até ser, mas na minha cabeça, faz sentido. Aliás, eu não tô obrigando você a ler este texto, né? Então, se ele for ridículo ou enfadonho, tudo bem. Estou aqui mais por mim mesmo e acho que é isso que eu preciso e é o que conta para mim.

O segundo motivo de não ter um blog sério


Ninguém mais lê. Este é o motivo. Certo dia (faz um tempo já, na verdade) eu estava conversando com uma amiga que dizia que ela não consegue mais ler. E olha que ela sempre foi uma leitora ávida e interessada, é jornalista e tem até um livro publicado! Imagina as pessoas que não gostam de ler? Claro, todo mundo lê o tempo todo, mas basicamente memes, manchetes, textos abreviados do Twitter e Whatsapp.

Agora… textões na internet? Só de uma vez ou outra e ainda quando vem acompanhado de uma foto que chame a atenção. Uma reportagem em uma revista, um livro, um texto longo como este em um blog… ninguém quer saber. Para quem não sabe, eu trabalho com marketing de conteúdo. Fazendo relatórios para clientes vejo que o tempo médio de visita nos textos é de alguns segundos. Quando dá 2 minutos é uma vitória!

Ninguém consegue ler e entender um texto com mais de 800 palavras em um blog em menos de 2 minutos! Eu duvido! Daí que a gente caiu num mundo em que aberrações como correntes de Whatsapp cercadas de emojis e figurinhas decidem eleições, onde fake news criadas a partir de manchetes falsas “informam” as pessoas… quer dizer: quem produz conteúdo falso sabe que as pessoas não leem. Assim, facilitam para elas.

Então para quê eu vou criar um blog sério? Eu já aceitei pra mim que jamais vou ser alguém bem-sucedido ou relevante na sociedade. Tentarei trilhar um caminho profissional que me dê alguma satisfação, vou escrever meus livros com carinho e dedicação porque me fazem feliz e alimentar este blog porque tenho um carinho por ele, já que ele existe há mais de uma década e representa uma parte importante de quem eu sou.

Mas esperar ser um autor reconhecido ou sonhar com uma vida com qualquer nível de luxo? Isso eu já não espero mais. Por isso, não faz sentido eu fingir que o que eu digo tem alguma relevância nesse mundo de conteúdo que é a internet. Serão palavras atiradas em um mar cheio de gente com opinião se estapeando por atenção e para se posicionarem como os donos da razão sobre aquele assunto.

Então, se você achar que o que eu leio, o que assisto e o que escrevo pode ser útil para você, e se minhas reflexões cheias de hipocrisia e aprendizado constante te entreterem de alguma maneira e servirem de um passatempo agradável por alguns minutos, fique à vontade para continuar visitando este blog. Se tudo der certo, a partir deste 2021 ele será atualizado semanalmente.