Não é novidade para
quem me conhece que eu acompanho o trabalho da Wanessa Camargo desde
o início da carreira. Chorei ouvindo o CD, tentei “converter” o
máximo de pessoas a gostarem, defendi os álbuns até mesmo em
trabalhos na faculdade. Tudo isso desde o início da carreira, quando
ouvi pela primeira vez O Amor Não Deixa. Aqui no blog, fiz até uma
tag “Série Wanessa” pra divulgar e falar do trabalho dela.
Receio que este seja um
dos últimos posts da Série Wanessa.
Para quem não a
acompanha, explico o porquê desse post e o motivo da minha
insatisfação. Recentemente a cantora começou a divulgar músicas
do seu novo álbum de estúdio, o oitavo (sem contar os
que são ao vivo). E eis que a sonoridade apresentada é
completamente diferente de qualquer coisa que ela já fez até aqui. As duas primeiras músicas, Vai Que Vira Amor e Coração Embriagado, são o que existe de mais sem criatividade no sertanejo
atual. É o tipo de música que só muda a letra, porque qualquer
canção, de qualquer artista ou dupla que faça esse estilo, tem
exatamente a mesma levada, o mesmo ritmo. Cansativo, para dizer o
mínimo.
Mas por que isso é
ruim? Ela não pode mudar o estilo?
Olha, poder, pode. Ela
faz o que quer com a carreira dela e eu não sou ninguém para
impedir ou chamar a atenção. Se nem a gravadora conseguiu pará-la
com essa ideia maluca (o que resultou na rescisão do contrato), o que
eu poderia fazer? No entanto, a questão principal é: o que ela
ganha com isso? Qual a estratégia por trás dessa reviravolta? Quem
é Wanessa Camargo na música brasileira? É o que vamos discutir
juntos. Siga comigo!
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Trabalhar com sonoridades diferentes não é algo incomum no mundo da música
Seria
desonesto dizer que artistas não podem trabalhar com sonoridades
diferentes daquelas que normalmente atuam. Os exemplos estão aos
montes por aí. Lá fora, Lady Gaga abandonou por uns momentos o pop
para fazer um trabalho no jazz ao lado do renomado Tony Bennett. E
ela não foi a primeira a fazer parceria com o cantor. Christina Aguilera e Amy Winehouse também já fizeram projetos similares. Mas
perceba que nem Bennett, nem qualquer uma das três cantoras
abandonaram a originalidade da sua arte para encabeçar um projeto
alheio ao que se propõem. Em todos os casos, foi uma iniciativa
paralela, complementar, que só acrescentou à carreira de todos
eles.
E
mesmo quem mudou de estilo conseguiu fazer essa transição de uma
maneira muito estratégica, respeitosa com seu público e natural. É
o caso de Taylor Swift. A antes princesa do country, hoje trabalha
com uma sonoridade focada no pop. Contudo, isso não aconteceu de uma
hora para outra. Primeiramente que o trabalho dela já atingia muito
do público que consumia música pop. Aproveitando esse nicho, as
composições da cantora começaram a misturar sonoridades (o que
pode ser percebido mais nitidamente no álbum Red), até migrar
completamente com o mais recente 1989.
Arquirrival
de Swift, Katy Perry também mudou a sonoridade. Mas aqui por conta
de uma realidade bem diferente. Perry fazia música gospel e não se
sentia realizada neste tipo de música. A falência da gravadora com
quem ela havia lançado um álbum só aumentou a insatisfação com o
seu trabalho, e ela resolveu rumar para o pop. Essa mudança, no
entanto, era consciente e planejada. Katy queria outro
público, outra música, outro alcance.
Trazendo
para a realidade brasileira, foi algo parecido com o que aconteceu
com Sandy. A filha de Xororó encerrou a dupla com o irmão e, por
consequência, desligou-se do pop romântico, investindo em algo que
já fazia parte dos seus gostos pessoais há muito tempo: a MPB, ou
pop alternativo. O público da cantora, conhecendo ela e a verdade
nessa nova proposta, a seguiu e, desde então, ela permanece com uma carreira de sucesso e uma consistência exemplar.
Também
no Brasil, Ivete Sangalo, nascida do axé, já realizou trabalhos em MPB, fez parcerias com cantores sertanejos e até lançou um álbum infantil. Mas da mesma maneira que as parceiras de Tony Bennett, foi
uma iniciativa à parte, paralela ao seu trabalho original. O axé
sempre se manteve.
Portanto,
essa experimentação é positiva e rica para qualquer artista. Faz
com que ele cresça e experimente sons e realidades que ampliam suas
próprias perspectivas dentro do seu trabalho. A mistura de
sonoridades é algo extremamente bem-vindo na música e só é
alcançada quando acontecem essas misturas. Mas esse, infelizmente,
não é o caso da Wanessa. E eu vou explicar por quê.
Com aposta no sertanejo, Wanessa Camargo mostra sua falta de identidade
Wanessa
Camargo começou fazendo o que a indústria fonográfica chama de
teen pop. Era um pop
romântico voltado majoritariamente ao público adolescente, similar
ao que faziam na época Sandy & Junior, KLB, SNZ e Felipe Dilon,
só para citar alguns exemplos. Por isso, é mentira dizer que ela
está “voltando às raízes”. Ela nunca cantou sertanejo nos seus
álbuns. Existem apenas duas composições e uma música vertida para
o português assinada pelo pai da cantora, Zezé di Camargo.
Questionado sobre a razão de não escrever mais músicas para a
própria filha, Zezé disse, à época, que era porque ela fazia uma
música muito diferente da que ele faz.
No
segundo álbum, e eu já relatei isso aqui, Wanessa dizia que estava
buscando uma sonoridade “muito mais pop”. Sempre disse que se
espelhava em Madonna e, enquanto seu pai escutava as músicas do
gosto dele, ela sempre procurava por Michael Jackson e Abba.
A
neta de Francisco saiu do teen pop com
o maduro W: um álbum com uma pegada bem mais consistente e letras
mais densas, compostas por batidas underground e guitarras bem
marcadas que davam uma encorpada nas canções de uma maneira
espetacular, mesmo nas faixas mais românticas, como Não Resisto a
Nós Dois. Decididamente, isso não tem nada de sertanejo.
Se
há algo de “sertanejo” na carreira de Wanessa é o Total,
inclusive um dos álbuns que mais gosto dela. Não por ser o melhor,
mas por fazer mais o meu estilo pessoal. Aqui, a cantora veio com uma
proposta muito parecida com Shania Twain, em um country pop muito
similar ao que Taylor Swift fazia. Ainda assim, não era sertanejo,
no sentido mais bruto da palavra. Tem até um forró no meio —
duramente criticado pelos fãs, inclusive —, mas era apenas uma
faixa em um álbum que, apesar de menos pop (não ausente de pop),
retratava o momento pessoal dela: apaixonada e recém-casada, as
músicas vieram mais doces, leves e românticas.
Ao
migrar, de fato, para o pop, Wanessa contemplou um público que já a
acompanhava e que gostava desse estilo. Quem ouvia a garota Camargo
também ouvia Britney Spears (não à toa ela foi capa da revista Vip
com a chamada “A nossa Britney), Beyoncé (inclusive ela fez o show
de abertura da apresentação da musa norte-americana) e Madonna (de
quem Wanessa fazia covers constantes em seus shows). Talvez tenha
causado algum estranhamento em alguns fãs mais acostumados com uma
levada mais romântica, mas não foi uma troca de público. Apenas
uma decisão mais firme baseada nas preferências pessoais e na
naturalidade que seus seguidores teriam em migrar para este novo
momento.
Apesar
do álbum Meu Momento, o primeiro dessa época, ser um desastre, e
ter músicas dignas de vergonha alheia (como a dispensável Máquina
Digital), Fly foi extremamente bem elogiada. Quem a acompanhava sabia
que era um projeto quase que experimental. Ou seja, Wanessa estava
tentando encontrar a melhor música para essa sua nova fase e sua
plateia sabia disso.
No
entanto, depois de se firmar neste estilo, conquistar um público bem
específico (com muita dificuldade, diga-se de passagem), Wanessa sai
das pistas para gravar um arrocha muito tosco. Ignora o já
conquistado, choca os fãs, muda a sonoridade e abandona toda a
trajetória trilhada até então.
A
justificativa, martelada por muitos veículos de imprensa e
sustentada pela própria cantora e sua equipe, é de que Wanessa
estaria “voltando às origens”. Mentira! Pode ser um retorno às
origens da família. Mas da carreira, não. Ela nunca cantou o que
está cantando agora. E mesmo se considerarmos que ela está
retornando às origens familiares, nem isso é verdade. As músicas
apresentadas até agora em nada se parecem com o que seu pai faz, nem
com que Chitãozinho e Xororó e Leandro e Leonardo — citados como
referência — faziam. Wanessa apresenta um sertanejo universitário,
preguiçoso e sem identidade.
As possíveis razões para essa mudança
Wanessa
não é burra. Na “era DNA”, ela chamou Naldo para compor uma
música para ela. O cantor, febre nacional depois da horrorosa Amor de Chocolate, fez a igualmente medonha Deixa Rolar. Infelizmente,
Naldo já tinha caído no esquecimento e a cantora não conseguiu
aproveitar o sucesso do colega para ganhar pontinhos nos charts
também.
Aí
está só um exemplo de como ela sempre esteve bem atenta ao momento
da música. Investir no sertanejo é um movimento natural de quem
quem aproveitar a demanda que existe por esse estilo musical.
Desespero por dinheiro? Não, eu não diria isso. Inclusive porque
Wanessa não precisa e porque isso é desmerecê-la. É apenas uma
necessidade pessoal, vejam:
Wanessa
vinha se apresentando em boates. A DNA Tour não conseguiu levar
aquela estrutura do DVD Brasil afora. Com aquele formato, o show
passou apenas por três capitais: São Paulo, Rio de Janeiro e Belo
Horizonte e acumulou fracasso de público fora da capital paulista.
Algo que Wanessa sempre deixou nítido foi seu desejo de estar no
palco, de fazer um show bonito, com uma estrutura bacana, para um
público grande. E imagino ser frustrante para ela se apresentar em
lugares que, depois dela, semanas depois recebiam pessoas do calibre
de Inês Brasil. Nada contra Inês, mas é que o tipo de trabalho que
ela faz é um abismo de diferença do que o apresentado por Wanessa,
não é verdade?
Portanto,
olhar fenômenos do sertanejo como Marcos & Belutti, Henrique &
Juliano, Luan Santana, Gustavo Lima, Maiara & Maraisa lotarem
estádios e casas de shows, além da experiência do próprio pai e
tio, certamente causou um desejo de mudança, uma necessidade de
conquistar aquilo ali. No lugar de batalhar na música que vinha
fazendo para garantir seu espaço (o que se conquista com o tempo,
não de um trabalho para outro), ela foi pelo mais fácil: trocou o
estilo, gravadora, empresário e começou a fazer música “linha de
produção” para abocanhar um público que naturalmente já
acompanha artistas desse estilo.
O
triste é que Wanessa Camargo chegou aqui, depois de mais de 15 anos
de carreira, sem nada. Ela não tem um estilo, não tem um público
crítico e fiel que a acompanha (com raras exceções, os fãs que
permanecem com ela o fazem pela pessoa incrível que ela é, além de
se importarem menos com a música), além de ter jogado fora uma
legião de pessoas que haviam acreditado nela depois dos trabalhos
mais recentemente lançados.
Ou
seja, com sorte, pode ser que este seja um bom momento para a
carreira dela. Por quanto tempo isso vai durar e se vai ser algo
memorável, digno de ser lembrado daqui alguns anos, só poderemos
ver mais adiante (eu acredito que não). Espero, sinceramente, que um
dia ela encontre sua verdadeira identidade e siga um caminho bem
definido. Não adianta dar a desculpa de que pessoas mudam e que isso
é natural. Os fãs atuais do ACDC não os acompanhariam se eles
decidissem fazer country music. Os fãs do Wesley Safadão não o
acompanhariam se ele decidisse gravar música erudita. Essas mudanças
bruscas na carreira de qualquer artista, quando não calculadas e com
um objetivo bem definido, são irresponsáveis e injustificáveis.
Só
espero que Wanessa um dia entenda isso para observar que o que ela
está fazendo não é sinônimo de maturidade. É uma prova de
desrespeito e indecisão.
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