quarta-feira, 26 de junho de 2013

Eu, o Silvio Santos de mim mesmo

Eu e minhas companhias fiéis ao longo dessa minha
humilde vida: Wanessa, Tolkien e Celine Dion
Neste ano, a minha emissora está fazendo 20 anos. Eu me lembro da primeira vez que brinquei que tinha uma emissora. Foi em meados de maio de 1993. Num terreno de barro nos fundos de casa, peguei um graveto, fiz um círculo no chão – imaginando ser o palco – e escrevi no centro: XOU DO JULIANO. Eu não sabia que show se escrevia com sh, porque a minha referência era a Maria das Graças Meneghel com seu “Xou da Xuxa”.
Brincar de “emissora” era uma das minhas atividades favoritas. Como eu sempre fui muito sozinho, quieto, não tinha amigos e meu pai não me deixava me juntar às turminhas da rua, ficava sozinho, empunhando um frasco de desodorante (o meu predileto era um vermelho, de vidro, da Avon, que eu morria de medo de quebrar), fingindo ser apresentador de um programa de auditório.

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Aos poucos a emissora foi ganhando forma. Logo que aprendi a escrever, assistia o Jornal Hoje, anotava as notícias num caderninho e depois ia para trás do sofá, o usando como bancada, para noticiar os fatos que eu, maioria, nem entendia, no “Jornal do Juliano”.
Não demorou a surgir as novelas. Mas como eu fazia todos os personagens, precisava fechar todas as cortinas da casa para impedir que os vizinhos me vissem falando sozinho e produzindo os sons da trilha incidental com a boca.
Precisei, então, organizar a minha emissora em uma grade de programação, com horários e tudo certinho. Daí me divertia muito: passava a tarde toda interpretando na novela que começava depois do programa infantil vespertino e, em seguida, tinha que fazer o filme que encerrava a programação da tarde.
Produzi os slogans, logomarcas. Ligava para as rádios pedindo músicas para, depois, gravá-las em uma fita e usar nos meus programas de auditório: daí colocava a música para rodar e fingia ser o Zezé di Camargo (e o Luciano) e a Daniela Mercury, como atrações no “Juliano de Alegria”.
As minhas novelas viraram livros. Era a forma que eu tinha para torná-los conhecidos. Livros que estão engavetados, empilhados. Livros que são, na verdade, cadernos repletos de erros de concordância e de grafia, diante da pouca idade que tinha ao criar tudo aquilo: comecei a fazer minhas “adaptações” aos 12 anos. Até saí no jornal, em matéria escrita pelo Rubens Herbst – que viria ser meu colega de trabalho anos mais tarde em A Notícia – depois de muita insistência. Lembro que chorava tanto que meus olhos, cheios de água, não me deixavam ler a matéria que me enchera de tanta emoção.
Quase no final do ginásio, minha emissora já era um conglomerado de comunicação: tinha revista, jornal, emissora aberta e fechada, rádio e portal de internet. E eu era um Silvio Santos disso tudo: apresentava e administrava.
Minha paixão por TV cresceu comigo e a emissora nunca deixou de existir. Quis tornar meu sonho realidade e resolvi cursar jornalismo para ficar um pouco mais próximo dessa realidade. Nesse meio tempo, trabalhei por alguns meses na área de exibição da RBS TV (afiliada da Globo em Santa Catarina) e tomei conhecimento dos preços de anúncios e pacotes de patrocínio. Aos fins de semana, sozinho lá na TV, copiava em rascunhos os preços dos programas globais para ter uma noção de valores e compor a tabela de preços de anúncios da minha emissora. Eu guardo isso. Fiz tabela e tudo no Excel.
Ainda hoje tenho a programação da minha emissora embora, obviamente, não brinque mais de nada: não interpreto, não apresento mais programa nenhum e não sou âncora de nenhum jornal. Nem de verdade, embora já o tenha feito por quase dois anos.
Minha vida, hoje, não é nem um pouco parecida com o que aquele garotinho de 1993 sonhava. Nada saiu conforme eu esperava. Perdoem-me, mas hoje eu me sinto no direito de abrir meu coração: meu sonho de infância, ser ator, não chegou nem perto de se concretizar, não levei adiante. Não consigo falar com o meu pai e não nutro mais nenhum respeito por ele. Minha família está em frangalhos, a situação lá em casa está um inferno, tenho sonhos que não sei se vou realizar e, claro, não vou ser nenhum apresentador infantil, nem vou gravar CDs, muito menos ter uma emissora.
Sou jornalista, mas estou longe da TV. Trabalho com pessoas que guardo num lugar especial do meu coração, porque fizeram parte da minha vida acadêmica. E, talvez pela minha emissora ainda existir (tem até terreno aqui em Joinville e a fachada do prédio desenhada num caderno lá em casa!), guardo um pouco de criança em mim. Essa criança me faz acreditar que cada Natal e, principalmente por causa do dia de hoje, cada aniversário é especial, é um dia meu, único, especial, mágico, divertido, exclusivo, gostoso, cheio de presentes e bolo de morango. Mas aos poucos tudo isso, como tudo na minha vida, está se esvaindo. Talvez porque minha vida esteja tão desestruturada e tudo tenha saído tão diferente do esperado no meu destino que os natais e aniversários estejam deixando de ser tudo aquilo que falei há pouco e tornando-se, ano após ano, cada vez mais comuns e triviais.
Soube que vão construir uma escola particular no terreno que eu imaginava minha emissora. Os cadernos com meus “livros” (nenhum publicado) estão se desfazendo por causa do mofo e da umidade na gaveta. Alguns nem existem mais (eram 13 ao total). Os programas infantis estão em escassez na TV, dizem que o jornalismo está acabando e está dando espaço às mídias “alternativas” e eu nem sei onde vou morar no mês que vem.
Mas neste ano, ainda, continuo achando meu aniversário uma data especial. O terreno da minha emissora não tem indícios de construção e meus “livros”, os que ainda existem, estão legíveis. Vamos ver por quanto tempo esses sonhos vão perdurar.
Obrigado pela leitura. Desculpem minha esquisitice e, com licença, vou ali apagar minhas velinhas.

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5 comentários:

Unknown disse...

Um dos textos mais sinceros e reflexivos que já li. Pode ser que o Silvio Santos de cada um de nós nunca chegue a realizar-se como o Senor Abravanel teve a sorte (e competência) de fazê-lo. Mas uma pessoa não tem seu valor medido pela quantidade de sonhos realizados, mas pela quantidade de dias que continuou sonhando. 25 dias é apenas o começo da Vida. O próprio Silvio Santos, aos 25 ainda não tinha sua emissora de tevê.

Meu grande amigo, a vida é maior do que nossas decepções. Você é um grande ser humano (sentido literal e figurado). Amo você.

Moisés

Ariane disse...

Ju, você quase me fez chorar junto. Achei o comentário do Moisés lindo também. Se aqui fosse o Facebook, pode imaginar que eu curti e compartilhei o seu post (apesar de não curtir a tristeza) e curti também o comentário do Moisés. Você é uma pessoa mágica. Beijos

Unknown disse...

PARABENS PELO ANIVERSARIO E LEMBRE-SE: O QUE É ESCRITO JAMAIS É ESQUECIDO, FICA ETERNIZADO.

erli disse...

Parabens pelo texto e quase chorei, mas acredite nos teus sonhos e para realiza-los não tem idade.
Que vc tenha um aniversario cheio de energias positivas,que Deus continue iluminando seus passos,e fico muito feliz de fazer aniversario no mesmo dia que vc! Creia que para mim é um presente, um privilegio! parabens para nós! bjusss

Linconl disse...

Ao ler seu texto consegui projetar cada frase, cada momento dessa história. Um salve para sua sensibilidade! Eu conheci um Juliano sincero, prestativo, menino-grande-com-muitos-sonhos-ainda e pode passar anos e anos, esse Juliano continuará existindo "Para Nossa Alegria". Parabéns, queridão! Não importa que atribulações passamos na vida. Não importa o gosto amargo que determinadas situações nos dispõe. Continue sorrindo pra vida, buscando seus desejos e temente a Deus. Confie e siga em frente. Desejo o que for de mais lindo e especial no seu aniversário. Que perdure a alegria de viver e ser feliz. Segue meu abraço caloroso e meu beijo. Parabéns, Juli!! :D