segunda-feira, 1 de agosto de 2022

O que está acontecendo com o SBT?


Não é difícil responder a esta pergunta: o declínio do SBT é falta de investimentos, de renovação, de criatividade. Não tem nada a ver com uma eventual derrocada da TV aberta, não.

A TV aberta deixou de ser hegemônica, isso é indiscutível, mas ela ainda é forte e resistirá por muito tempo ainda, principalmente no Brasil. Não há outro meio de comunicação mais democrático, barato e acessível do que a TV aberta. Quem falar aqui em streaming vai levar um peteleco na orelha, porque isso é pensamento de quem conhece pouco (e mal) a realidade do Brasil e suas desigualdades tecnológicas, econômicas e geográficas.

Mas voltemos ao SBT. Atualmente, a emissora ocupa o terceiro lugar no PNT (Painel Nacional de Televisão, índice medidor da audiência nas principais capitais e regiões metropolitanas do país) e em São Paulo (principal mercado publicitário do Brasil). Perdeu a vice-liderança para a Record que, mesmo vendendo a madrugada para a igreja Universal e dando traço de Ibope (ou seja, quase não pontua nas medições), ainda consegue superar a emissora de Silvio Santos na média-dia.

E eu cito a Record porque, embora seja a vice-líder, ela está longe de ocupar o coração e a preferência dos brasileiros. A Record até faz bons números, mas está longe de ser um fenômeno, de provocar memórias afetivas ou de ser assunto em roda de conversa.

Então, a perda do SBT tem mais a ver com a incompetência e imobilidade dos gestores e criativos do que com um eventual mérito da emissora de Edir Macedo.

O SBT de ontem

Topa Tudo por Dinheiro, um clássico do SBT

Por que falar agora do SBT? Porque me entristece a situação atual da emissora. Embora sempre tenha ocupado a "Liderança absoluta do segundo lugar", como ela própria divulgou décadas atrás em um de seus slogans, ela é parte da história e da memória afetiva da televisão brasileira, algo que a Record jamais alcançou e também não dá indícios de que vá alcançar.

Foi o SBT que trouxe o Bozo para o Brasil, que alavancou a carreira de Angélica, Marília Gabriela, Mara Maravilha (credo!), Eliana, Gugu Liberato, Maísa Silva, Serginho Groisman e Celso Portiolli, que fez o Brasil conhecer e dançar com ET e Rodolfo, que escandalizou (e sexualizou) o país com a banheira do Gugu, que tornou a torta na cara algo divertido... enfim... muito da cultura popular brasileira passou pelo SBT.

Silvio Santos e o elenco da primeira edição da
Casa dos Artistas: reality venceu a Globo.

Foi no SBT que o reality show Ídolos virou uma febre nacional ― e perdeu a graça quando foi para a Record. No SBT, Super Nanny causou alívio a muitos pais e revolta em educadores, psicólogos e pedagogos. O SBT criou a Casa dos Artistas, um dos únicos programas na história a vencer o Fantástico. Do SBT veio Chaves, que virou mania nacional e segue sendo amado até hoje. E também de lá conhecemos clássicos mexicanos como Maria do Bairro ― a telenovela mais assistida do mundo ―, assim como as duas outras Marias da trilogia de Talia: a Marimar e a Mercedes.

No SBT assistimos A Usurpadora e rimos do absurdo título Pícara Sonhadora. Tem o Disney Cruj que permanece na memória afetiva das crianças dos anos 1990, assim como o divertido Fantasia (quem não lembra do “I de escola” da Carla Perez?), o Show do Milhão, o Qual é a Música?, Rebeldes ― que, de novo, perdeu a graça ao ir para a Record ― e, como deixar de fora, o Popstar, que revelou o fenômeno arrasa-quarteirão Rouge e, mais tarde (mas com menos intensidade) o Br'oz.

No SBT o Ratinho deixou de ser um policialesco ridículo como era na Record e se tornou um circo. E se hoje o programa é ridículo tal qual seu apresentador, no seu auge (em que quase derrotava a novela da Globo) era, no mínimo, divertido.

No SBT vimos todos os filmes do Harry Potter e de O Senhor dos Anéis, clássicos modernos incontestáveis. E foi no SBT que tivemos o melhor tratamento para a transmissão da cerimônia do Oscar, que a Globo sempre mostrou incompleto.

Apesar de ter passado por quase todas as emissoras que já existiram no país, Hebe Camargo deixou sua marca no SBT e era a cara da emissora. Assim como Carlos Alberto de Nóbrega, que segue com a sua A Praça é Nossa, programa que nos tempos áureos brigava com Chico Anísio nas noites de sábado da Globo.

E, claro, o SBT é a casa de Silvio Santos. Como esquecer do peão do Baú, do Tentação (sinto saudades, inclusive), das pegadinhas que até hoje são reprisadas de tão divertidas?

 O SBT de hoje

Sem Chaves, Silvio Santos inventou um programa
sobre nada para preencher os buracos na grade.
Reprises sempre foram o forte do SBT. É de se perder as contas a quantidade de vezes que a emissora reprisou as já citadas Maria do Bairro e A Usurpadora. O Chaves e o Chapolin Colorado, então, foram repetidos ao infinito ― e continuariam sendo, não fosse o imbróglio de direitos autorais entre Televisa e o herdeiro de Bolaños. Porém, sempre haviam atrações novas e interessantes, e isso já não existe.

Hoje o SBT é TV de reprises de conteúdos que já perderam o apelo (como das novelas infantis, cujo público já cresceu e um novo público não está sendo alimentado com novas histórias) e programas desinteressantes. A ausência de Silvio Santos, causada pelas limitações da pandemia de Covid-19 empurrou as filhas do apresentador a assumir a posição dele. Era um movimento esperado, claro, considerando a idade do animador. Porém, a perda da graça só prova que as filhas dele não têm o mesmo apelo, nem o mesmo carisma.

Hoje ninguém lembra do SBT. A TV não produz nada que fique na memória das pessoas. Celso Portiolli comanda um Domingo Legal que se divide entre Passa ou Repassa (repassado) e um jogo patrocinado pela loja de um lunático. Eliana, ainda que vença na audiência, tem um programa assistencialista sem animação alguma. O Casos de Família perdeu o apelo, as novelas mexicanas soam cada vez mais desinteressantes com a farta oferta de conteúdos melhores em várias mídias e nem os programas do Baú chamam a atenção.

Vem pra Cá: uma das poucas criações recentes e
originais da emissora. Com apresentadores sem
carisma, atração durou apenas 10 meses.

O jornalismo é pífio e qualquer novidade esbarra na falta de investimento em conteúdo e equipe (caso do terrível Fofocalizando) e na total ausência de carisma dos apresentadores (como visto no extinto e breve matinal Vem Pra Cá). Sobra o esporte, no qual a emissora tá se agarrando como uma boia de salva-vidas. Mas nem nisso o SBT consegue agradar. A maior parte das pessoas que acompanha futebol não gosta das transmissões da emissora. Sobram reclamações e as competições são jogadas no meio da programação com quase nenhum outro espaço ao longo da grade da emissora. É como se o futebol fosse um espaço comprado, não uma atração integrada às demais atrações.

Além do mais, a falta de experiência e cacife para manter os campeonatos coloca a TV em risco. As ligas europeias até podem permanecer na casa, considerando que seus principais concorrentes são TVs pagas, mas a Libertadores, por exemplo, já sofreu uma dura investida da Globo, que a quis de volta para sua programação.

Se, no combo, o SBT perder o Silvio Santos, a emissora corre o risco de morrer. Corre o boato que o homem do Baú já colocou a TV à venda por R$ 1 bilhão. A ver se alguém interessa. Se continuar com os Abravanel, é capaz de virar uma Record 2, mas com menos investimento e com conteúdo religioso e um ou outro reality show para preencher a programação. Se for vendida, corre o risco de virar mais uma Rede TV ou ser porta-voz das sandices da Jovem Pan, que até pouco tempo procurava uma rede aberta para estrear seu canal de notícias — acabou ficando na TV fechada mesmo.

Seja como for, sem uma profunda e urgente mudança, o SBT não sobrevive. Sem investimentos em streaming e com uma programação velha e modorrenta, não sobrarão atrativos aos telespectadores e muito menos ao mercado publicitário. Triste. Esperamos que minhas previsões não se concretizem e que a TV da Anhanguera se profissionalize para lembrar os bons tempos. Fazer isso descolando-se da imagem de Silvio Santos será um desafio, mas indispensável à sobrevivência da empresa.


sexta-feira, 17 de setembro de 2021

Professores e jornalistas: os novos vilões do Brasil

 

Vivemos em uma época em que eu me sinto atingido pessoalmente por conta do pensamento coletivo a respeito de alguns assuntos essenciais de uma sociedade. O governo que temos reforça esses pensamentos (ou talvez seja apenas um reflexo desse pensamento geral).


Refiro-me ao posicionamento atual a respeito da atividade de professor (que almejo) e a profissão do jornalista (que exerço).

Comecemos com os professores. Muito se fala sobre a valorização desses profissionais. Mas o que as pessoas andam querendo é, na verdade, crucificá-los. Ao professor são atribuídas as funções de corretor de conduta (como se isso não fosse algo a ser aprendido em casa), vilão do desempenho das crianças/adolescentes (como se isso também não fosse algo extra-escola) e, como se não bastasse, agora o professor é também o culpado dos males do país.

O professor é doutrinador, perversor, alienado e alienante. Diante dele, os alunos são tidos ao mesmo tempo como idiotas ou balas de canhão de uma hipotética guerrilha ideológica. Como nunca, os professores estão sendo achincalhados, privados de exercer sua autoridade de cátedra, estão sendo cerceados e condenados. E aquela maldita ideia do "Escola Sem Partido" é a maior representação disso tudo.

Como se não bastasse, o salário e as condições de trabalho continuam sendo insuficientes e, em alguns casos, degradantes.

Em seguida vêm os jornalistas. Se não bastasse o momento crítico da profissão -- em que redações estão sendo fechadas, figuras experientes e diplomadas precisam concorrer com blogueiros cheios de achismos e influenciadores digitais que não influenciam ninguém --, o trabalho jornalístico vem sendo cada dia mais desacreditado e anulado.

Ninguém está dizendo que os jornalistas são imunes a erros. Entretanto, é perigoso dizer que os jornalistas participam de uma conspiração global contra pensamentos e ideologias contrárias às deles.

Jornalistas têm sua ética profissional, a paixão pelo que fazem e o compromisso social de investigar e noticiar. Sobretudo, trabalham para jogar luz sobre eventos obscuros, denunciar erros e cobrar soluções. Elogios acríticos se limitam às assessorias de imprensa, cujo trabalho é essencial, mas precisam inevitavelmente passar pelo filtro das redações, independentes ou não.

Quer dizer, é triste que eu esteja envolvido com, talvez, duas das profissões mais desacreditadas do Brasil atual. E mais triste ainda é saber que tem muita gente que vê essas duas profissões no papel de vilãs da sociedade.
Fiquem alertas: desacreditar professores e jornalistas não é atitude de quem quer justiça social e democracia.

O inimigo não está nas salas de aula, nem mesmo nas redações. Eles estão nas grandes corporações, nas redes de milícias, no Congresso Nacional e, sobretudo, no Palácio do Planalto.

Nós jornalistas e também os professores (que um dia espero ser) apenas queremos um Brasil mais desenvolvido e uma educação transformada e transformadora. E nosso poder de fogo é quase zero contra essa cruzada de invalidação dessas duas profissões tão essenciais à sociedade.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Coisas que esquecemos que deveriam ser unanimidade universal

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
 Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil


Existem coisas que deveriam ser unanimidade entre todos os seres humanos, não é verdade? Por exemplo: não é admissível que existam pessoas que passam fome e sede. Da mesma forma, não é justificável o fato de que há gente que não tenha onde morar com dignidade, nem tenha acesso a serviços de saúde. O preconceito, seja qual for, jamais deveria ser incentivado, sob nenhuma hipótese. 


Por isso, eu não entendo as pessoas que fuçam argumentos para normalizar coisas que não são normais sob nenhuma ótica. “Ah, mas é rico é porque trabalhou por isso”. Ou “ah, mora na rua porque quer”. Ou “ah, não se esforçou o bastante”. Ou, “ah, não tem que dar o peixe, tem que ensinar a pescar”. Pior: “ah, mas como o mercado financeiro vai reagir a qualquer iniciativa que ajude essas pessoas?”. 


O mais aterrorizante é que, não raro, isso acontece defendido por justificativas religiosas. O que me traz ao infame Bolsonaro, essa besta quadrada que muitos insistem em chamar de presidente, mas que, na verdade, é apenas uma acidente da natureza, que permitiu vir ao mundo essa criatura abjeta que, por infortúnio do destino, acabou num cargo de poder.


O problema é que Bolsonaro está onde está porque ele é o sintoma de uma doença social. Quando um ser vivo fica doente e começa a ter bolhas purulentas e fétidas pelo corpo todo, a razão do mal-estar não são as bolhas purulentas: elas apenas são provocadas por uma enfermidade agressiva. São consequência, não causa.


No caso, Bolsonaro é a bolha purulenta e fétida causada pela doença social chamada normalização do anormal. O que seria essa normalização do anormal? Eu listo:


  • Ver antagonistas políticos como inimigos. É verdade que nós temos, como sociedade, divergências profundas sobre como resolver os problemas do mundo. Mas, no fim, o que deveríamos querer é que todos tenham acesso às condições mínimas para sobreviver com dignidade. Para Bolsonaro (e seus seguidores), não é assim. Só quem tem direito a condições humanas de vida são os que pensam como eles. O restante, que morra e vá pro inferno.

  • Ver a pobreza como preguiça. Quem pensa como Bolsonaro acha que pobreza é uma consequência da falta de vontade. É fácil você falar que é possível conquistar o que quiser só com o trabalho se você vive em condições para isso. Mas tem gente que não tem nem água potável em casa! Os problemas sociais são complexos demais para ter uma visão tão reducionista e simplista das coisas.

  • Ver o mundo como uma eterna luta de bem contra o mal. Tenham dó, minha gente! Isso deve ser muita Disney na vida das pessoas. Ninguém é completamente bom ou completamente mal. Mas, para Bolsonaro e seus seguidores, há um mal a ser derrotado e eles, os bolsonaristas, são o bem, os emissários de Deus.

  • Ver a religião como prova de moral. Religião não é sinônimo de retidão em nenhum lugar do mundo, nem na história. Aliás, religião não, né? Cristianismo. Para Bolsonaro, só presta quem é cristão. As outras crenças são apenas toleradas e devem se curvar à maioria. Os seguidores dessa anta pensam exatamente assim. Porém, se religião fosse sinônimo de moral, não haveria tantos casos de pedofilia na Igreja Católica e de lavagem de dinheiro em igrejas neopentecostais. Pior é que gente como Bolsonaro acha que as “ovelhas negras” dentro do cristianismo são exceção, não regra. Tolinhos!

  • Ver o mundo como um grande palco de teorias conspiratórias. Todo mundo já ouviu a expressão “história de pescador”, não é mesmo? Antigamente, isso era motivo de riso, mas hoje as pessoas estão acreditando nas histórias de pescador! E fazem mais esforço para acreditar em teorias da conspiração do que na realidade. A cegueira é tão absurda que eles se recusam a ouvir argumentos comprováveis para sustentar suas crendices ridículas, como a Nova Ordem Mundial, Terra Plana e outras sandices.


Há muito mais a ser dito, mas falar do Bolsonaro me dá gastrite, então vou parar. Ele é o pior mal que a humanidade já provou em décadas, sem dúvida. Um ser asqueroso e desprezível, desumano e mentiroso, egoísta e egocêntrico. Mas, como disse, o pior é saber que ele não é a doença, mas um sintoma dela. Se Bolsonaro deixar de existir, ou se recolher em sua insignificância, a ruindade e a desumanidade que ele representa continuarão existindo.


Claro, Bolsonaro não é o único ser desprezível no mundo. Tem muito empresário que tira comida dos pobres para engordar seu bolso, têm muitos outros políticos que deixam faltar oxigênio em hospitais para garantir sua decoração na casa de praia, enfim… Mas Bolsonaro concentra o que há de ruim em todas as pessoas e em todas as práticas nocivas à sociedade em si mesmo. Incrível a façanha desse sujeito!


Comecei este texto falando do que é inaceitável na sociedade e terminei falando do Bolsonaro. Enfim, pra dar alguma coerência ao que tô falando aqui, quero, então, elencar de novo o que eu acho que jamais deveria ser aceito, mas acaba sendo naturalizado pelas pessoas atualmente: gente passando fome e sede, gente sem ter onde morar dignamente, cidadãos sem acesso à saúde, o preconceito e Bolsonaro.


Deveria ser uma opinião unânime na sociedade. Ninguém deveria aceitar nada disso. Infelizmente, não é assim que acontece. É por isso que estamos caindo buraco abaixo. 


Enquanto não recuperarmos nossa humanidade, nossa capacidade de olhar o outro com compreensão e respeito, jamais seremos dignos deste mundo. É triste pensar assim, mas mais triste é saber que há quem não se importe com nada disso, que faça da sua vida uma grande bajulação ao próprio umbigo.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

Ano novo, blog novo

 

Início do ano todo mundo se enche de projetos e planos. E mais uma vez um de meus projetos é voltar a atualizar este espaço com alguma frequência. Não porque eu esteja ávido por leitores, porque queira ganhar dinheiro com o blog ou porque tenha algum plano para ele. Eu simplesmente acho importante para mim.

Mas eu decidi que este será, primordialmente, um espaço de desabafo, de reflexões pessoais. Em outros momentos, o Andarilho serviu como uma forma de eu argumentar, trazer informação sobre política, sociedade, filmes, livros e assuntos da cultura pop. Porém, há dois problemas (entre tantos outros, claro) de se continuar a produzir esse tipo de conteúdo.

Vocês não estão cansados de conteúdo?


Nós estamos tão mergulhados em informações em todos os lugares e sem tempo para aproveitarmos ou absorvermos elas. Uma vez, meu professor de Fotografia na faculdade de jornalismo nos incentivou a ter um blog. A justificativa dele era que, enquanto jornalistas, era importante a gente expor a nossa opinião sobre as coisas e que isso poderia servir como um diferencial no mercado.

Hoje, acredito, o conselho dele seria outro. As pessoas andam tão cheias de opinião que não são capazes de ouvir o contraditório. Não há mais debate, apenas lacração e militância contra tudo e contra todos.

As pessoas estão erradas em militar? Bom, na minha visão, depende. Há militâncias legítimas, mas há aquelas ridículas, como quem prega um dia do orgulho hétero ou aqueles que dizem que não deveria existir o Dia da Consciência Negra, mas o Dia da Consciência Humana.

O que quero dizer com isso? É que eu não pretendo que este blog seja um lugar para ensinar ou informar nada a ninguém. Como qualquer rede social, que a maioria das pessoas simplesmente acessa para curtir conteúdos inúteis e saber da vida do outro (seria mais leve se fosse assim, embora não seja mais, infelizmente ― e é estranho dizer “infelizmente” sobre ficar de fuxico sobre a vida do outro, né? Pra ver o nível em que chegamos, mas divago), este será uma espécie de diário virtual. Como os blogs das antigas, sabe?

Sinto falta de uma internet mais leve, divertida e despretensiosa. Aliás, não só de a internet ser assim, mas de a vida ser assim. Nós temos levado tudo a sério demais e até o discurso de não levar as coisas muito a sério tem virado conteúdo vendável, vocês percebem? Textos do tipo: “6 motivos para não levar as coisas a sério demais”; ou “5 formas de levar as coisas menos a sério”. Me canso.

Parece contraditório e hipócrita o que estou dizendo? No sentido de não querer mais tanto conteúdo e ainda assim estar alimentando um blog? Pode até ser, mas na minha cabeça, faz sentido. Aliás, eu não tô obrigando você a ler este texto, né? Então, se ele for ridículo ou enfadonho, tudo bem. Estou aqui mais por mim mesmo e acho que é isso que eu preciso e é o que conta para mim.

O segundo motivo de não ter um blog sério


Ninguém mais lê. Este é o motivo. Certo dia (faz um tempo já, na verdade) eu estava conversando com uma amiga que dizia que ela não consegue mais ler. E olha que ela sempre foi uma leitora ávida e interessada, é jornalista e tem até um livro publicado! Imagina as pessoas que não gostam de ler? Claro, todo mundo lê o tempo todo, mas basicamente memes, manchetes, textos abreviados do Twitter e Whatsapp.

Agora… textões na internet? Só de uma vez ou outra e ainda quando vem acompanhado de uma foto que chame a atenção. Uma reportagem em uma revista, um livro, um texto longo como este em um blog… ninguém quer saber. Para quem não sabe, eu trabalho com marketing de conteúdo. Fazendo relatórios para clientes vejo que o tempo médio de visita nos textos é de alguns segundos. Quando dá 2 minutos é uma vitória!

Ninguém consegue ler e entender um texto com mais de 800 palavras em um blog em menos de 2 minutos! Eu duvido! Daí que a gente caiu num mundo em que aberrações como correntes de Whatsapp cercadas de emojis e figurinhas decidem eleições, onde fake news criadas a partir de manchetes falsas “informam” as pessoas… quer dizer: quem produz conteúdo falso sabe que as pessoas não leem. Assim, facilitam para elas.

Então para quê eu vou criar um blog sério? Eu já aceitei pra mim que jamais vou ser alguém bem-sucedido ou relevante na sociedade. Tentarei trilhar um caminho profissional que me dê alguma satisfação, vou escrever meus livros com carinho e dedicação porque me fazem feliz e alimentar este blog porque tenho um carinho por ele, já que ele existe há mais de uma década e representa uma parte importante de quem eu sou.

Mas esperar ser um autor reconhecido ou sonhar com uma vida com qualquer nível de luxo? Isso eu já não espero mais. Por isso, não faz sentido eu fingir que o que eu digo tem alguma relevância nesse mundo de conteúdo que é a internet. Serão palavras atiradas em um mar cheio de gente com opinião se estapeando por atenção e para se posicionarem como os donos da razão sobre aquele assunto.

Então, se você achar que o que eu leio, o que assisto e o que escrevo pode ser útil para você, e se minhas reflexões cheias de hipocrisia e aprendizado constante te entreterem de alguma maneira e servirem de um passatempo agradável por alguns minutos, fique à vontade para continuar visitando este blog. Se tudo der certo, a partir deste 2021 ele será atualizado semanalmente.

segunda-feira, 1 de outubro de 2018

A tempestade que se avizinha com as Eleições 2018


É triste constatar que parece não haver esperanças para o Brasil superar a instabilidade que se instaurou no país após as eleições de 2014. E é ainda mais lamentável — o que, confesso a vocês, me faz chorar enquanto escrevo estas palavras — que aqueles que têm o poder de amenizar a crise política e moral que assolou o país não fazem nada além de aprofundá-la ainda mais em benefício de interesses particulares e mesquinhos.

Estas eleições de 2018, pensava-se, poderiam representar a oportunidade de superar tudo o que aconteceu de ruim no Brasil nos últimos anos. Um impeachment sem crime de responsabilidade, um vice-presidente que conspirou abertamente para tomar o poder e implantou um plano de governo para o qual ele não foi eleito e que foi rejeitado nas urnas, além de um clima de profunda polarização que impede as pessoas de pensarem soluções para o país.

Contudo, não é o que se percebe. Ainda que eu tenha votado em Dilma no segundo turno das eleições passadas, sou um crítico ferrenho (e justo) à sua gestão pré-impeachment. Porque, ainda que ela estivesse com meio pé nos programas sociais e nas políticas de inclusão que a diferenciavam de Aécio Neves, a ex-presidente quis consertar a crise econômica causada por decisões equivocadas do seu primeiro governo implantando medidas que não condiziam com o que havia sido prometido em campanha.

Mas, para além dos erros do PT — e aí incluem-se os escândalos de corrupção que afetam grande parte da alta patente do partido — a imprensa pouco faz e pouco fez para motivar as pessoas ao bom senso e à reflexão. A crise moral do país foi jogada inteiramente nas costas do Partido dos Trabalhadores quando, segundo levantamento da revista Congresso em Foco, o pior partido do país, com o maior número de congressistas sob suspeita de corrupção, é o PP (seguido por PT e PMDB, empatados em segundo lugar).

Em relação ao número de políticos cassados, o líder do ranking é o Democratas, seguido do PMDB e do PSDB. O PT é apenas o 9º colocado. Entretanto, quando são encontradas malas de dinheiro de políticos protegidos do presidente da República, quando ex-candidatos à presidência são flagrados em áudios comprometedores com pedido de propina e quando governadores ordenam o massacre de professores que pedem condições mais dignas de trabalho, a imprensa, em geral, faz pouco alarde, e prefere dizer que o maior problema do país é a compra de um pedalinho em um sítio.

Não que um pedalinho supostamente comprado com dinheiro de corrupção não seja motivo de indignação. Mas é que a narrativa de criminalização da política é tão ardilosa e tacanha que faz com que as pessoas personifiquem seu ódio em uma única pessoa: o ex-presidente Lula. Enquanto isso, todos os outros políticos continuam em seus joguinhos de poder e o toma-lá-dá-cá da política, sem que o povo se dê conta de que está sendo manipulado.

O que nos traz a uma aberração chamada Bolsonaro.

Bolsonaro e a desumanização da política


Como Lula virou sinônimo de corrupção, o PT foi conduzido ao posto de quadrilha criminosa e os outros partidos e políticos, embora não nomeados, acabam sendo vistos como mais do mesmo pela população que até ontem não dava a mínima ao processo eleitoral, um serzinho hediondo e incompetente, que já trocou mais de partido do que de meias — aliás, por muito tempo ele foi do PP, o partido mais corrupto, como já exposto aqui — caiu nas graças do povo.

Com um discurso fácil, promessas de soluções milagrosas e imediatas, um vocabulário cheio de moralismo e ufanismo, Bolsonaro foi ganhando espaço na mídia e na atenção dos brasileiros. O hoje candidato do PSL, declaradamente, afirma não entender nada de economia, disse que vai terceirizar as decisões sobre a política econômica ao seu “posto Ipiranga”, o banqueiro Paulo Guedes, e afirma que vai devolver a moralidade ao país.

E por moralidade entenda-se a aceitação das demandas do que há de pior no ativismo político-religioso brasileiro, representado por Silas Malafaia e Marco Feliciano. Insanidades inexistentes como a famigerada “ideologia de gênero” devem ser combatidas, no que deve ser uma caça às bruxas do século XXI. Políticas de valorização e proteção às mulheres, direitos dos LGBTQIs, políticas inclusivas à população negra e indígena, pautas ambientais e sociais devem ser sumariamente interrompidas. Até aí, porém, a população não vai reclamar. Em geral, os conservadores não querem mesmo dar voz às minorias.

Agora, a coisa vai complicar quando Bolsonaro começar, via Paulo Guedes, a implementar a pauta liberal que está fazendo com que o mercado o tolere, mesmo diante de sua imensa ignorância em relação a temas cruciais para o desenvolvimento do Brasil. Assim, uma nova política de impostos deve ser implementada para agradar os mais ricos, o que deve aprofundar a desigualdade social. Direitos trabalhistas serão ainda mais massacrados, o que deve precarizar ainda mais as relações de trabalho.

Com tudo isso, o poder de compra dos brasileiros deve diminuir, situação agravada com as prometidas privatizações, que vão fazer com que as pessoas precisem pagar ainda mais por serviços básicos à população. E aí não se espante se o ensino começar a ser cobrado e se o SUS deixar de ser universal.

Desigualdade social, como não é segredo para ninguém, acaba gerando mais violência. E a proposta de Bolsonaro para isso é simplesmente facilitar o acesso ao porte de arma para defesa pessoal e dar poder à polícia para matar sem ser julgada por isso. E aqui eu não consigo entender como alguém pode ouvir esse tipo de proposta e acreditar que uma coisa dessas pode dar certo.

Estive pensando esses dias que, infelizmente, as pessoas não vão nem poder reclamar que Bolsonaro não cumpriu o que prometeu. Porque, afinal, ele não tem nenhuma proposta de modernização da educação. Em nenhum momento ouvi ele falar de ações efetivas para combate ao desemprego. Nem mesmo li qualquer coisa sobre planos para estancar as facções criminosas que espalham medo e violência para o país.

Bolsonaro não fala de turismo, nem de comércio exterior. Ele não fala de medidas concretas de combate à corrupção, nem de empreendedorismo, nem sobre cultura, nem de valorização aos professores e políticas para melhoria da saúde pública.

O que ele fala é apenas que as minorias têm que se submeter às maiorias e todos aqueles absurdos que já listei. E tudo bem se você acha que a pauta liberal é a mais coerente para o enfrentamento das mazelas do Brasil. Mas mesmo que eu concordasse com isso, não confiaria a Bolsonaro a missão de implementá-la. 

Infelizmente, o que temos do outro lado é o PT. Arrasado pela profunda rejeição popular, o partido pode até ter um programa de governo mais consistente do que o do candidato do PSL, mas não conseguirá governar com tranquilidade, já que o fantasma da polarização irá infernizar Haddad assim como o fez com Dilma. 

Com um Congresso conservador, é bem possível que, novamente como ocorreu com Dilma, Haddad vá enfrentar vários boicotes, que vão paralizar o país e impedirão a busca por caminhos para resolver o que precisa ser resolvido, em busca de colocar o país novamente nos trilhos.

Resta-nos torcer para que as pesquisas estejam erradas, que as pessoas estejam mais conscientes do que demonstram e que essas minhas previsões catastróficas estejam erradas. Confesso que costumo me auto-consolar lembrando de quantas mazelas a Europa, por exemplo, teve que enfrentar até que alcançasse algum tipo de cidadania e justiça social.

Porém, se pudéssemos aprender com a História, talvez não tivéssemos que repetir os erros do Velho Continente. O problema é que até mesmo a História tem sido alvo de disputas ideológicas e desconfianças de todo tipo. Dessa maneira, fica bem difícil encontrarmos uma saída.

Que Deus, seja qual for o seu, tenha misericórdia de nós!

domingo, 5 de agosto de 2018

Blog Em Busca do Reinado

Quem me vê ausente daqui acha que eu estou pouco me lixando para a minha vida na blogosfera, certo? Bom, não é exatamente verdade, embora eu também não esteja cumprindo minha meta de atualizações semanais.

Acontece que, ainda que O Andarilho esteja um tanto desatualizado, eu tenho me dedicado ao blog de Em Busca do Reinado. Pois é, pessoal. Se vocês não sabem — ou sabem mais ou menos — eu tenho tentado dividir minha rotina atribulada com o processo de divulgação do meu livro. E tenho falhado miseravelmente, infelizmente, apesar dos meus esforços.

Então, quando tenho um tempo disponível, eu corro para atualizar o blog do livro, até porque ele vai me ajudar tanto a vender os exemplares que eu tenho estocado aqui em casa quanto a formar leitores para conseguir lançar a segunda parte da história, que está em desenvolvimento.

Então, peço para que vocês me perdoem a ausência. E se a saudade bater, é só passar pelo blog de Em Busca do Reinado e me ajudar a divulgá-lo, até porque isso é bem importante para mim.

Sempre que possível, acreditem, darei uma passada aqui para trocar algumas palavrinhas com vocês. Em ano de eleições, certamente temos muito a debater. Mas isso é assunto para outra hora, com mais tempo.

E já que eu falei o post todo do meu livro, se você ainda não tem seu exemplar, confere aqui onde você pode adquirir!

A gente se fala!


segunda-feira, 30 de abril de 2018

A volta da Wanessa Camargo ao pop


Eu havia dito que não falaria mais sobre a Wanessa Camargo aqui no blog. Não se tratava de boicote ou qualquer coisa do tipo. Apenas foi uma decisão levando em consideração o fato de que ela parou de tocar nas minhas playlists. Da mesma forma que eu não falo, sei lá, de Aerosmith, também não havia mais sentido eu falar de alguém que não faz mais parte da minha vida musical.

Mas é impossível acompanhar um artista por 15 anos ininterruptos e ficar alheio ao que ele faz ou diz, não é mesmo? Se você consegue, lamento, mas eu não.

Contudo, o que tenho a dizer da Wanessa Camargo e da sua Mulher Gato, nova música de trabalho da cantora, não é nada que eu já não tenha dito.

No último post que tratei dessa artista, discorri sobre o fato de que é perceptível que ela transita por gêneros diferentes conforme o movimento do público. Então, se o pop romântico está em alta (época do Sandy & Junior, quando ela foi lançada), é lá que ela fica. Quando o pop internacional caiu nas graças dos brasileiros (gays, especialmente), lá foi Wanessa cantar em inglês para este público! Porém, até então, eu estava achando tudo muito orgânico, e até explico isso neste post.

O problema foi quando o feminejo ganhou espaço nas rádios brasileiras e ela decidiu jogar no lixo o público, o carinho, o respeito, o lugar que ela tinha conquistado como diva pop para lançar um álbum de qualidade, no mínimo, duvidosa (que me recusei a comentar aqui no blog, apesar de ter ouvido). O trabalho de divulgação, felizmente (para ela), funcionou e Wanessa acabou acumulando alguns bons números. Entretanto, apesar de positivos, nada que se assemelhasse à Noite de Patroa ou aos 50 Reais.

Daí que Anitta começou a despontar fora do país, o grupo Rouge voltou com força, lotando shows em turnê por todo o Brasil, Pabllo Vittar conquistou reconhecimento além-fronteiras, novos nomes começaram a surgir e dominar rádios e charts e Wanessa, o que fez? Resolveu voltar ao pop. Confesso a vocês que eu já previa isso, portanto, não foi surpresa nenhuma.

Claro, não foi uma decisão impensada: a crise econômica por qual o Brasil passou pegou em cheio os sertanejos, conforme ilustra bem claramente esta matéria do G1.

Então, se não havia muito sinal de oportunidades entre gaitas e violas, melhor voltar às boates, não é mesmo?

A Mulher Gato


Wanessa Camargo volta ao pop com a música Mulher Gato. Num primeiro olhar, podemos dizer que a música não é de total mau gosto. Ela é um símbolo da independência sexual feminina. É uma letra forte, que mostra que a mulher tem o direito de sentir prazer e desejo, de fantasiar e sair do feijão-com-arroz de todo dia. Mas se observarmos através de uma lente mais ampla, vamos ver que isso pode não ser tão orgânico assim, e representar mais o chamado “ativismo de telão” do que um discurso vindo de uma necessidade de dar voz às mulheres.

Vamos ligar os pontos: na época em que estava tentando se firmar como cantora pop dos gays, Wanessa chegou a participar de conferências junto a Jean Wyllys no Congresso Nacional e afirmava que estava interessada em conversar com a então presidente Dilma Rousseff para tratar de temas caros aos direitos dos gays e das mulheres.

Wanessa, orgulhosa de ter votado no Aécio, aquele que queria
matar o primo, conforme áudios da PF.
Os anos passaram e o mesmo hino nacional que a filha de Zezé di Camargo cantou ao lado do deputado do PSOL foi entoado no alto de um trio elétrico na Avenida Paulista cercado pelos patos da Fiesp. O mesmo ambiente era dividido por figuras torpes como Marco Feliciano, a milícia MBL, o caricato Alexandre Frota, o deputado ex-militar pré-candidato à presidência que não vale ser nomeado e companhia bela. Pode existir neste país gente mais sem senso de respeito à mulher e aos gays do que esta turma?

Daí querer voltar ao pop depois de dar as costas a um público que a acolheu e cantar uma letra dita feminista depois de dar voz a pessoas que não estão nem aí para o direito das mulheres é no mínimo vergonhoso. E aqueles versos que deveriam representar liberdade sexual passam a ser nada mais do que vulgaridade.

A diferença entre empoderamento e vulgaridade está no quão natural e verdadeiro é o discurso. Se observarmos os últimos movimentos de Wanessa Camargo, pode até ser que exista alguma verdade no que ela diz (a influência de Madonna acaba fazendo um mea culpa), mas o que aparenta é apenas oportunismo.

E, desse jeito, vai ser difícil conquistar novos públicos.

Qual vai ser o próximo gênero: depois do retorno triunfal de Ivete Sangalo, o axé?