
Divago a respeito pois estava lendo uma entrevista velha e polêmica das páginas amarelas de Veja. E como não podemos falar e dar certezas do que não conhecemos, vou usar uma personagem que eu acompanho bastante para defender a minha tese. Lembrando que não estou defendendo a personagem, defendo a tese.
A referida entrevista antiga (2003) e polêmica, é com Wanessa Camargo. Certa altura da conversa, eis que o repórter pergunta: "Existe alguma qualidade musical no seu trabalho?". A cantora responde: "Eu não sou uma grande cantora, mas estou aprendendo. Hoje, por exemplo, não consigo ouvir o meu disco de estréia porque acho que os vocais são muito ruins. Tenho consciência de que meu trabalho é comercial. O povo gosta de ouvir baladas, elas tocam mais no rádio e ajudam a vender discos". Pergunto, portanto: o que não é comercial?
Se me disserem: Roberto Carlos, Gal Costa, Milton Nascimento, Gilberto Gil e esses grandes nomes da música nacional, ou mesmo internacional, caso de Enya, Celine Dion e outros, digo que tudo é comercial. Voltando à Wanessa; se formos fazer uma busca qualquer, encontraremos referências como: "Wanessa já fez duetos com Elba Ramalho, Rita Lee, Zeca Pagodinho, Daniela Mercury..." e vai citando. Grandes nomes atestando que "se ela é capaz de cantar com esses, é porque não é tão ruim".
Quando qualquer gravadora lança algum CD, mesmo que seja do Leoni, Titãs ou Paralamas do Sucesso, está de olho nos índices econômicos (prova de que também é comercial esses dois, é o CD ao vivo com as duas bandas juntas cantando sucessos). Não há nada que não seja comercial. Consigo avistar menos comercialidade no cinema, em casos como curtas que geralmente são feitos por gente amante de cinema, ou longas não holywoodianos. O Brasil também ultimamente vem produzindo um cinema autenticamente comercial.
Theodor Wiesengrund-Adorno, na teoria da comunicação, já falava da "Indústria Cultural". A cultura sendo usada como forma de industrialização. Se formos observar o lado capitalista da coisa, com certeza isso é negativo, mas não diminui o valor cultural do objeto. Claro que essa "indústria cultural", a comercialidade nesse meio e o fruto disso tudo, pode gerar diversos produtos com qualidades discutíveis na música (Xuxa só para Baixinhos, Hight Scholl Musical, RBD, entre tantos outros exemplos e, inclusive, a Wanessa Camargo) e em outras manifestações também. É o caso, por exemplo, da infelicidade do Brasil só filmar seus podres, pobres, tragédias, violências e favelas, porque sabe que enquanto mais sangue e agressividade, mais vai agradar os expectadores nacionais. Mas Milton Nascimento, Titãs, Paralamas do Sucesso e uma galera boa aí não deixa de ter qualidade só por serem usados como objetos comerciais. O selo de qualidade de qualquer artista que almeja um reconhecimento e ainda trilha pelas pedras da "balada" (como diz Wanessa) para conquistar espaço, é ser elogiado por esses grandes nomes, justamente porque criou-se neles um produto de credibilidade e referência.
Portanto, não concordo que as pessoas digam: "não assito esse filme, não gosto desse cantor, não ouço essa música porque é comercial". No mundo capitalista que vivemos tudo é comercial, queiramos, ou não. A qualidade é outro campo de discussão, mas a comercialidade, me desculpem; repito: está em tudo.